29 de junho de 2022

O que você precisa saber sobre crise febril ou convulsão febril

Visão geral sobre as crises febris ou convulsões febris

Em primeiro lugar, se seu filho(a) ou criança conhecida teve uma crise febril (CF), entendo como essa situação pode ser assustadora e pretendo fornecer aqui algumas informações que auxiliem na compreensão do quadro e ajudem a criança querida a ter o melhor acompanhamento possível.

As Crises Febris (CFs) ou Convulsões Febris são raras?

Não, as CFs não são raras. Talvez você ainda não tivesse ouvido falar sobre o assunto, mas as CFs são a forma mais comum de crises em crianças, com uma prevalência estimada entre 2 e 5%, o que significa que de cada 100 crianças, de duas até cinco delas podem ter pelo menos uma CF.

O que são Crises Febris (CFs) ou Convulsões Febris?

As CFs são crises que ocorrem em crianças entre 6 meses e 5 anos de vida, num contexto de febre, na ausência de infecções do sistema nervoso central, em crianças que nunca tiveram crises afebris e que não têm problemas neurológicos ou clínicos que predisponham a um risco aumentado de crises (como por exemplo paralisia cerebral ou Síndrome de Down).

Qual a diferença entre crises febris simples (CFSs) e crises febris complexas (CFCs)?

As crises febris simples:

  • Têm duração menor do que 15 minutos;
  • Têm início generalizado;
  • Não devem recorrer em 24 horas;

Têm um período logo após a crise (que chamamos de pós ictal) breve e sem sinais focais como paralisia de Todd (quando a criança move menos um dos lados do corpo logo ao término da crise).

As CFC fogem dessa definição em um dos termos, durando mais do que 15 minutos, ou tendo início focal ou sinais pós ictais focais, ou recorrendo em 24 horas.

Qual a causa das crises febris?

Acredita-se que estejam envolvidas causas genéticas, cuja manifestação esteja relacionada à um período sensível do desenvolvimento (idade entre 6-60 meses).

O que deve ser feito com a criança na urgência?

Em primeiro lugar avaliar se a criança está estável ou se ainda tem crise. Caso tenha crises na chegada ao pronto socorro, é provável que estejamos diante de uma crise febril complexa e de um estado de mal febril. Nesse caso medicações devem ser feitas imediatamente para interrupção das crises.

Com a criança estável, o pediatra deve avaliar a criança clinicamente e com exames laboratoriais adicionais se for necessário para procurar a causa da infecção que levou à febre.            

Na presença de sinais de meningite (como rigidez de nuca), para crianças que estavam em uso de antibióticos (que podem mascarar os sinais de meningite) antes das crises, para aquelas menores de 18 meses (onde os sinais de meningite podem ser mais difíceis de avaliar) ou naquelas com calendário vacinal atrasada, pode ser necessária a punção de líquor para descartar meningite.

Exames de ressonância magnética ou eletroencefalograma devem ser solicitados?

Nas crianças com crises febris simples não são necessários, pois não costumam trazer alterações significativas. Já nas crianças com crises febris complexas devem ser solicitados, pois podem trazer informações adicionais relevantes para o entendimento do caso.

Quais as chances das CFs recorrerem?

Tanto nas CFSs como nas CFCs, a chance de recorrência está em torno de 10-70%. Os fatores de risco que aumentam a chance de recorrência são:

  • Primeiro episódio antes dos 15 meses;
  • Presença de epilepsia em parentes de primeiro grau;
  • Crises febris em parentes de primeiro grau;
  • Presença de infecções febris frequentes;
  • Temperatura baixa no início da crise.

Em pacientes sem nenhum desses fatores, o risco de recorrência é de 10%; na presença de 1-2 fatores de risco, a chance de recorrência é de 25-50%. Na presença de três ou mais fatores de risco, a chance de recorrência é de 50-100%.

Quais os impactos a longo prazo de uma crise febril?

Nas crianças com crise febril simples, não há risco aumentado de alterações neurológicas e cognitivas quando comparadas as crianças que não tiveram crises febris.

No entanto, há um aumento das chances de essa criança desenvolver epilepsia no futuro. A incidência geral de epilepsia na população é de 0,5%, o que significa que uma em cada 200 pessoas terão o diagnóstico de epilepsia ao longo da vida. A incidência de epilepsia nas pessoas que tiveram crise febril é de 1-1,5%, o que significa que duas a três pessoas em cada 200 terão epilepsia no futuro.

E afinal qual o motivo de diferenciarmos as CFSs e as CFCs?

O motivo é que quando consideramos fatores de risco para epilepsia em crianças que tiveram crises febris, a presença de crise febril complexa é um fator de risco maior do que a presença de crise febril simples. Outros fatores de risco são:

  • Idade maior do que três anos após a primeira crise febril;
  • História familiar de epilepsia;
  • Duração da febre menor do que uma hora antes da crise;
  • Presença de alteração do neurodesenvolvimento.

O uso de antitérmicos ajuda a evitar a crise febril?

Uma revisão sistemática recente dos estudos de maior qualidade investigando essa questão mostrou que se o seu filho teve uma crise febril num dado momento de infecção, usar antitérmicos na infecção seguinte não evita que ele volte a ter crise febril.

No entanto, se ele teve uma crise febril e ainda está com febre, existe um estudo mostrando que pode haver benefício do uso de antitérmico de 6/6h nas primeiras 24 horas após a primeira crise febril, caso ainda haja temperatura maior do que 38 graus.

Nesse estudo, foram avaliados 423 pacientes dos quais 219 receberam paracetamol e a recorrência de crise febril foi 9% no grupo que recebeu paracetamol x 23,5 % no grupo que não recebeu, o que foi considerada uma diferença significativa na análise estatística (p < 0.001).

Existe como evitar o desenvolvimento de epilepsia no futuro?

Até o momento não se identificaram tratamentos para crises febris capazes de evitar o desenvolvimento de epilepsia no futuro.

O que fazer caso você presencie uma crise febril?

  • Procure permanecer calmo;
  • Se houver alguma roupa apertada, principalmente ao redor do pescoço, afrouxe a roupa;
  • Se a criança está inconsciente, posicione deitada de lado para evitar aspiração de saliva ou vômito;
  • Não force a abertura da boca, não coloque objetos dentro da boca e não ofereça líquidos por boca para criança inconsciente;
  • Observe o tipo da crise (como começou, como estavam os membros da pessoa, como estava a face e o olhar da pessoa, se ela respondia quando chamada) e duração da mesma;
  • Se for o caso, siga as recomendações do médico do paciente sobre uso profilático de medicamentos e tempo para procurar o pronto-socorro.

Existe tratamento para crises febris?

Como o tratamento das crises febris não evita o desenvolvimento de epilepsia no futuro e os medicamentos antiepilépticos têm efeitos colaterais, o tratamento para crises febris de rotina não está indicado.

Em alguns casos como presença de crises febris prolongadas ou que necessitaram medicações dentro do hospital para interrupção ou crises muito frequentes (mais do que três vezes em seis meses ou mais do que quatro vezes em um ano), o médico pode considerar o uso de medicação antiepiléptica, da classe dos benzodiazepínicos, e maneira intermitente (nas primeiras 24 horas de febre).

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